requiem for a dream

Marion: I love you, Harry. You make me feel like a person. Like I'm me... and I'm beautiful.
Harry Goldfarb: You are beautiful. You're the most beautiful girl in the world. You are my dream.



Dormia eu o sono dos vivos quando me chamaste.
Ainda hesitei, pelo medo que me é característico. Mas tu já me conhecias, tinhas-me estudado.
Soubeste chamar-me eu acabei por te seguir.
Segui-te sempre! Crédula. Leal e fiel, segui-te mesmo quando nem sabia por onde me levavas ou o porquê daqueles caminhos, que não nos levavam a lado nenhum.

Um dia acordei, estremunhada: seria só um sonho?
Tentei voltar a adormecer mas, às voltas com aquela dúvida, não consegui.
Tu continuavas a dormir e a sonhar ao meu lado.
Incapaz de te acordar, levantei-me para espairecer. Na esperança que, ao sentires a falta do meu corpo quente ao teu lado, me procurasses, me abraçasses e me dissesses que não era só um sonho. Ou pelo menos que me chamasses, preocupado, dando sinal que tinhas dado pela minha falta.
Mas não o fizeste. E eu na altura, se tivesse pensado, saberia que nunca o farias.

Quando me apercebi disso, e já mais calma, voltei para teu lado. Tarde demais.
Dormias agitado, inquieto. Esbracejavas e esperneavas.
Tentei abraçar-te, dizer-te que estava tudo bem. Mas não estava.
De tão agitado, acertaste-me em cheio e magoaste-me.
Tentei defender-me, e ao fazê-lo, talvez te tenha magoado também.
Tentei acordar-te. Mas nada resultou.
Vejo agora que não foi boa ideia ter-me deitado ao teu lado, tentar abraçar-te e tentar acordar-te, a bem ou à força. Deveria saber que jamais acordarias se não quisesses. E, no fundo, tu não querias.

Magoada, e angustiada por te ver assim, afastei-me, convencida que não me querias ao pé de ti.
Sentei-me no sofá, a ver-te dormir. Incapaz de pregar olho, definhando, sem comer. Observava-te, sem dares por mim.
Por diversas vezes fui até à porta, decidida a deixar-te, por não me quereres. Mas voltava sempre, pois parecias chamar por mim. E eu, precisava da certeza que ficavas bem.

Um dia pareceste-me mais calmo. Pareceste-me melhor.
Achei então que ficarias bem e abandonei o nosso quarto.
Já do lado de fora, ouvi-te chamar por mim. E voltei.

Sonhavas tranquilo, como me lembrava de ti.
Deitei-me a teu lado, a medo, sem te tocar.
Eu sinto-te procurar-me, provocando-me com os teus jogos, seduzindo-me com as tuas palavras, chamando-me para dentro do teu sonho. Mas eu continuo com dificuldade em adormecer. Quanto mais sonhar.

A dúvida persiste. Ainda temo que, para ti, tudo não passe disso mesmo, de um sonho. Apesar de ter a certeza que gostas de mim. Ou será da ideia de mim? Na verdade, tanto faz. Porque a maior ironia do grande sonho é mesmo essa: eu sou muito mais e ainda melhor do que o que tu sonhaste.
Esse sempre foi o problema. Não estava nos planos. Foi o revés que não estavas à espera.

Sim, é verdade, amor. Esse sonho terminou. Pelo menos para mim.
Contudo, contra todas as probabilidades, eu continuo onde sempre estive. Um pouco diferente, é certo. Mas igual na essência, que faço questão de manter.
Descontruíste-me até me descaracterizares. Destruíste-me, para tua própria sobrevivência. Eu sei, não precisas de me dizer.
Mas, teimosa, eu renasço, à luz do que sou. Porque sou real.
Talvez por isso, se as tuas asas são demasiado grandes para que possas caminhar, as minhas, continuam demasiado pequenas para que eu possa voar. Eu tento, mas canso-me rapidamente e volto ao mesmo lugar.

Mas dói! Dói muito estar aqui, querer algo mais que tudo, saber que está perto, que podia acontecer, e não conseguir tocar-lhe, por se recusar a acordar, por ser só um sonho.

Por isso me apetece tanto tocar-te e acordar-te suavemente. Sentir-te despertar, até que abras os olhos e me vejas ao teu lado. Sorrir-te, piscar-te o olho como que a dizer-te que é verdade, que sou real e que está tudo bem. E, ainda a meia voz, perguntar-te o que queres para o pequeno-almoço.

Sem comentários: